sexta-feira, dezembro 28, 2007

Dois Pobres movimentos

Embarque


Eu sento, respiro e descanso.
A fúria do meu estomago me remete a uma guerra que é travada no meu corpo. Sinto fome. Observo as barracas dos vendedores de badulaques e churrasco. Um senhor pula uma possa de água da chuva de dias atrás e eu respiro. O suor desce lavando a minha testa e sinto o estomago puxar sirene de alerta. Uma senhora passa ao meu lado, desenruga a pele para me observar com seus olhos caídos, e o muleque de rua insiste em querer engraxar minhas botas. Eu sei que estas estão sujas. Mas tenho apenas três reais para pagar o metrô e ainda se possível comer algo que preste.
Finjo enganar meu estomago. Levanto e prossigo no cortejo pobre dessa vida.

Ontem com um amigo, ficamos a falar do teatro ridículo que é a vida, seu processo.
Hoje fico a falar groselhas aqui na pobre expectativa que alguém de um sinal, do tipo, “Nossa como você escreve tão firmemente e entregue”, ou melhor, “Isso é genuinamente de um escritor em tal fase, veja os movimentos dos textos”. Montes de blá blá blá, na vã possibilidade de reconhecimento.
Ao ser indagado nesses dias como corriam meus dias, lembrei dos momentos que estão expressos logo acima, dias de calor, minha testa pinga suor, a fome continua corroendo meus órgãos. Meus olhos estão ressecados e ao coçarem começo a espirrar. O fluxo das idéias continua da mesma forma intermitente e desorganizado, nada bom para um sujeito organizado.
Minhas botas cada vez mais empoeiradas e não digo isso pela falta de uso, mas pela falta de água que deveria ser vertida do céu. Um calor desgraçado e ainda preciso correr atrás de documentos de um lado para outro e apenas ver meu rosto refletido em possas de água deixadas a oras atrás pelos vendedores de espetinhos da rua.
Eu me sentiria mais feliz, se não tivesse que iniciar essa bosta de ano já com milhões de preocupações na cabeça e um sem tanto de coisas a ter de fazer e lugares que não conheço a ter de ir, trocentos formulários a preencher, litros de saliva gastas a solicitar verbalmente andamentos e informações. Sorrisos, olhares, pedidos e mais um sem número de coisas a fazer.
Enfim, mais e mais, inchação e encheção de saco.


Desembarque