domingo, janeiro 01, 2006

Amanhece sempre

Embarque

Amanheceu. Exatamente às 7h43min a insônia abate a mim. Cansado ainda estou das nuances dialógicas, idas e vindas e uma infinidade seqüencial de situações que fodiam com a minha cabeça, meu corpo e minha auto-estima.
Recentemente me vi sozinho novamente e tentando sair de novo desse círculo que não me compraz de alguma forma, e observar o taxamento do que foi sentido e as fotografias lavadas com água sanitária com fins a serem limpadas das memórias coletivas. Essa observação dói, pois permitiu-se o descartamento das sensações e da própria humanidade. A limitação da própria raiva, do ódio por um maldito bem que doía mais que mil agulhas perfurando meu olho insistentemente e ainda assim não entendido, não dialogado, morto. Uma morte que é perpétua e se transforma assim quando os quadros foram pintados em minha memória, e este consigo próprio, para não mais passear pelas pradarias do sofrimento e meu olhar escarrava um nada, um completo vazio, mas o entendimento é uma força a ser usada e não apenas receptivamente ser aproveitada. É preciso ter força de vontade para tanto, ter fome de entendimento se pretender ouvir, querer ao menos fazer parte de algum outro maldito ponto de vista. Mas não! Isso é demais, estamos todos preocupados com as nossas próprias sensações e como poderemos manter o círculo de situações de forma que estas façam bem ao nosso ego, pouco importa o que do outro lado do espelho se passa, basta cultivar o não diálogo, a confusão de frases e situações, situações, situações e tudo regado a muito sangue dos jogadores, e assim a vida tornou-se um jogo e quando um participante quis participar de outra partida o verdadeiro não-entendimento entra em cena e aí sim o não-diálogo perpassa as situações e sangue escorre como um rio revolto por nossas vidas e o ódio retorna como um tufão levando nossas casas e sentimentos, esperanças e tudo mais que algum dia teria sido plantado. Aí sim as flores são pisadas, as fotografias deixadas ao limbo e tudo esquecido em nome do próprio ego e assim todos caminhamos serenos por sermos assim, por cobrar e não dar em troca sequiosos de que o tempo sozinho reconstruirá um algo nunca mais sentido. E disfarçando em olhares a própria morte e não querendo mais ser sugado pelo vortex e correndo ao encontro de algo que seja bom e não se transforme num rio de sangue e não mais tempestade passe por alguns tempos pelo meu lugar.
As 8h10 desta manhã sinto um certo regurgitar em meu corpo, talvez seja meu estômago podre por eu ter escolhido o caminho das tentativas mais fracas e humanas que pude presenciar, ou mesmo por ter conseguido aqui chegar ainda vivo depois de chorar horrores como um feto desmamado. Amar dói demais é dois demais sofrendo por querer compor um bem pelos demais. Fraquezas. Eu odeio as minhas próprias fraquezas. Mas as vencerei de meu jeito, e posso não muito bem não entrar nos anais da classificação humana e novamente ser taxado, ou nem isso. E, para tanto basta acostumar-se com isso, sentir muito próximo a indiferença e isso a vida já me fez entender. A indiferença faz parte dos sentimento dos que por mim brincavam. Não basta nada além disso, desta singela e bonita demonstração do nada com um alguém. Eu sinto-me assim. Lavado da memória. E até que é bom, pois, assim afogo mais rapidamente o que existia não deixo mais pedra sobre pedra, mais nada. Implodo tudo, como a indústria extrativa que implode uma mina na procura de um bem mineral, é assim que tudo acontece com todos. Implodiremos nossos grandes edifícios de amor, amizade, lealdade e tudo mais que compõem, ou melhor, compunha um que de alguma coisa qualquer.
Aproximação por bens, sofrimento por amor, amar por perfeição, dor por escolha. Rasgando em tiras de carne com uma lata de cerveja ainda molhada decompondo vou cada centímetro deste em tiras de carne e não se sangra mais.
Quem sabe este ano, sim este ano, seja coisa melhor? Quem sabe estes dias o vento mude o lado por onde sopra e poderemos rumar com nossos barcos a outros lugares?
Quem sabe?
Ainda esperamos o vento mudar o rumo dos acontecimentos, e sentado espero, espero, espero o nada chegar, assim de repente com ele estarei com o mais pobre vazio, com um vácuo sufocante que inflige a meu esôfago a pior das sensações e novamente sentido o enforcamento no momento certo e também pedir pelo que? Por amor, vida, esperança, completude, amizade, irmandade, paixão?
Pediremos por que quando tudo isto terminar? Talvez, ou nem isso, por uma pequena porção de terra pra que nossos restos mortais sejam depositados. Assim, como todos deveriam ser.
Mas não faço parte deste jogo, não quero mais isso. Não quero e não mereço mais nada disso. Sei que peco por tentar, mas eu tento, errando eu tento. Abrindo latas de lixo, ou portas, ou latas de comida, meu próprio corpo, entrando em casas noturnas, dançando a noite inteira, bebendo como um porco, chorando como uma criança sozinha na rua, tentando um prato novo, um trabalho novo, um homem novo. Eu quero alguém que lave minha pele com um tipo de substância nunca usada, que me toque como ninguém nunca me tocou, que me ame como ninguém nunca amou.
Estou mais velho, menos esperançoso mas talvez mais realista, e vejo o véu negro ser solicitado por todos. Tempos de morte, solidão e abate no matadouro.

Desembarque

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