terça-feira, abril 12, 2005

Vala comum

Embarque


Deitando esperando o pesado sono arrebatar este imundo ser, e corromper minha lucidez por estas difíceis, soturnas e solitárias noites. Vejo o arranjo das situações e nada me compraz a aceitar. -Mas não era exatamente isso que você queria? O fim, diriam a mim. Responderia eu. -Sim, perfilei as provas de todas as situações e as coloquei todas dentro de minha caixola cinzenta a extrair disso tudo a prova mór da impossibilidade, diria eu com outras palavras.
Mesmo assim o filete de vida jaz, e por mais que eu tente cavar e jogando terra emcima deste filete ele sobrevive por infímos meandros.
- Mas afinal o que você quer? A mim foi perguntado. Respondi de supetão como sempre o faço e às vezes até mesmo sem pensar. -O que eu quero? Quero paz, tranquilidade e um pouco de calor.
Isso irei adquirir com o tempo. Já me diziam a muito tempo que o mesmo tempo corrói as coisas. É assim mesmo, se não for, a lógica é a mesma. Eu vejo o arranjo não dito das situações e como um espectador, ou melhor, um telespectador assistindo tudo. Quadro a quadro, passo a passo, segundo a segundo.
A cova foi cavada, esperando apenas o vôo da coisa em si para depois de pesadas pás de terra ser soterrada, e por fim, uma rosa plantada ao monte da cova, a ser a última lembrança de tal vida.
Quão escorregadia é a vida e são as pessoas. Quão viscosa são as situações e filetes em vida se transformam em lembranças a rasgarem cada centímetro do ser que em vão ainda sentado no banco da estação sem nome a esperar o trem sem nome a algum lugar sem nome.
A experiência da vida é única mesmo, quem acreditaria que o homem a lua chegaria sem mesmo conhecer sua vida, os porquês que o fazem navegar, ou mesmo que chama é essa que arde nos peitos afeitos por dor e experiência e que reagem como uma simbiose química de substâncias misturadas num laboratório n'algum canto da terra. Vasta Terra. Imensa. Bilhões!
Ví num filme do Kurosawa uma frase. "Contemple este lugar, que antes foi um reino e que hoje apenas é destruição." Será essa a frase mesmo? Não me lembro.
Acho que tudo já foi feito e as provas à mesa estão. A cova já escavada apenas espera a descida do ser, da coisa. Os montes amontoam-se ao lado. Terra enegrecida a pintar minhas unhas, pois as escavei nas mãos e depositam-se nos caminhos de minha mão a me mostrar, lembrar, talhar em mim as capacidades do amor. De tão funda a vala, -uma vala comum- uma placa ao lado vai fixar a lembrança e um cravo, encravado como este site desencravará da pele de todos os seres cosmocócicos e assim cairá no esquecimento. Será corroído pelos vermes do tempo. Aqui jaz a esperança e o amor. O silêncio é o não. Decodificado a situações são. Imaginadas as dores, dias após dias. Atos, toques, cheiros, textura. Tudo mapeado exemplificado numa idéia do acontecer, acontecendo.
- O que fica? Pergunto.
- A dor. Sim ela. Desta feita mais fácil de ser soterrada. Como num ferimento. Para ser cicatrizada. A soterramos com gaze, merthiolate e esparadrapo. Dias seguirão às dores da alma e a sangrar a ferida ainda está, mas soterrada será. Por gaze ou por toneladas de terra que ainda enegrecerão minhas roupas, olhos, mãos, unhas, lábios, cútis e todo o resto do que resta das sobras da tempestade que amortizará nossas vãs imagens e esperanças de vida em vida na morte.

Desembarque

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