quarta-feira, novembro 17, 2004

de jardins e lagrimas...

Embarque


Sobre jardins e luzes

Certo dia, um velho ancião de uma cidadezinha a costa de algum mar, avistou um estranho brilho na praia. Obrservou atentamente o estranho dançar das luzes que chegavam a sua retina, e assim quieto, ficou a investigar tal brilho.
Não eram todos os dias que aquele dançar ensinuante a ele se apresentava. Mesmo assim, ele esquecia, por vários motivos...dentre eles um bem peculiar, para sua posição de ancião daquela cidadezinha que lá emcima do morro víamos quando chegávamos a aquelas redondezas.
Ele era uma espécie de jardineiro. Muito competente por sinal e responsável também. Levantava todos os dias ao amanhecer e começava vagarosamente a cuidar do jardim da cidade. Trabalho de perícia e delicado.
Passavam anos, e todos o viam cruzar no devagar trajeto da pequena cidade a caminho do jardim, que todos orgulhavam-se de dizer que era de todos.
E contribuiam com ele também. Davam tudo, sementes, adubo, ferramentas. Todas as coisas que eram necessário a um bom jardineiro a ele foram dadas, o velho senhor também ensinava seu ofício a jovens meninos e meninas que nele se espelhavam para um dia cuidarem de seus jardins.
Anos se passaram e o velho senhor, sempre a trabalhar, todos os dias e nem sequer uma folga. Ele amava aquilo.
Com suas mãos, pegava cada semente e afundava no leito da terra, assim pensava ele, que a aquele ser vivo estava fadado a se desenvolver no ventre da terra.
Dias e noites, as luzes daquela coisa no mar parece que o seguia. A espreita com um pouco de medo, ficava olhando, embasbacado tal dançar.
Ele morava no topo do alto monte, de lá tinha uma visão, não apenas da cidadezinha, mas da vastidão incomensurável, azul cristalina do mar.
E de dias a dias as luzes apareciam...ficavam até a noite, e só sumiam quando morto de cansado suas palpebras não se sustentavam mais e ele caia a beira da janela cansado.
Certo dia preparou uma trouxa com roupas e comida. enfiou na cabeça que seguiria aquela luz aonde quer que a mesma fosse.
Saiu de mansinho do vilarejo ao cair da noite, deixou o jardim preparado como sempre, para que nos outros dias, as crianças já podessem cuidar do mesmo. Seguiu a passos largos, descendo o morro íngreme a praia.
Chegou lá, pousou seus mantimentos na areia lisa e ficou a esfregar os grãos em seus pés. Numa reza que durou por mais de vinte minutos, ficou a evocar seus deuses para que o ajudasse nessa longa viagem, que parecia estar por vir.
Ajoelhou a areia nas últimas frases da oração, e sentiu uma gota de lágrima escorrer por entre seu marcado rosto. Algo muito forte o impulssionava ao mar. A luz naquela altura da noite mais forte se fazia.
E lá seguiu o velho ancião, e seus mantimentos à suas costas. A nadar construindo seu próprio zênite, cortando as águas. Nadou por duas horas e impacientemente viu a luz se mover também. E engraçado, ele a via mover-se impacientemente como ele.
Ficava boiando nas frias águas a pensar, o que poderia fazer para nela chegar e assim desvendar aquele segredo.
Tentou mergulhando, se esconder e chegar nela mais facilmente...engano. Ao mergulhar a luz desceu também e ficou a observá-lo. Agora quem ordenava era ela, a luz. A seus comandos o velho ancião a seguia aonde quer que fosse, mesmo exausto e faminto.
A luz mergulhou, pensou ele.
Prendeu a respiração e fortemente nadando tentou ir a seu encontro. Colocou-se atrás de um recife, a se esconder parecia. O ancião nadou até essa recife, parecia uma cuia enorme. Ao entrar cortou o braço e a sangrar não desistiu de procurar pela luz. Ali nada havia mais, apenas a água turva, e seu sangue ia espraiando-se pelo mar.
Sentiu o braço fisgar, e seu peito a doer. Saiu da recife e nadou a superfície. Lá chegando viu novamente a luz. Cansado e faminto tentou novamente ir a seu encontro, não conseguiu. Quase se entrgou às águas, foi vagarosamente nadando a praia com o braço sangrando e cansado.
Sentia-se frustrado. Não quis naquele momento subir de volta a cidade, apenas avistou alguns corvos a voarem pela cidade, mas a aquela altura, de tão cansado que estava nem se deu conta do que estava acontecendo.
Horas depois, dia já claro, tomou o caminho de volta e pôs-se a voltar a cidade. No meio do caminho encontrou alguns moradores, que a ele não olharam. Passando pela cidade, todos cochichavam frases pelas suas costas. Ele não mais entendia tudo aquilo. Quis ir a sua própria casa, talvez descançar e pensar sobre o ocorrido na noite anterior.
Surpresa...triste supresa. A paisagem desolada imprimia em seus rosto, muito mais que uma lágrima descida na noite anterior. Seu jardim tinha sido completamente devastado pelos corvos que ali, procuravam alimentos. Exausto e sem forças nem mais para produzir lágrimas, viu novamente a luz brilhar no meio do oceano, e como costumeiramente a dançar como anteriormente.
O ancião, não mais entendia o que tinha se passado. Seu jardim tão bem cuidado, desaparecera apenas naquela situação. Quando chorando pegou um punhado de terra e roicha e atacou à casa, de lá todos os corvos sairam voando de encontro a luz, numa algazarra imensa. De supetão lançou seu velho corpo ao cânion construido pelo mar. Ficou alí por horas, sendo debatido nas rochas. A população antonita o pegou. Morto foi enterrado na área de seu jardim.
Anos se passaram. o jardim veio florescer pelas dos jovens que o ancião ensinava...a luz, depois de enterrado sumiu para nunca mais aparecer.

"O que é que se encontra no ínicio? O jardim ou o jardineiro? É o jardineiro. Havendo um jardineiro, mais cedo ou mais tarde um jardim aparecerá. Mas, havendo um jardim sem jardineiro, mais cedo ou mais tarde ele desaparecerá. O que é um jardineiro? Uma pessoa cujo o pensamento está cheio de jardins. O que faz um jardim são os pensamentos do jardineiro" Rubem Alves


A respeito de morte e escuridão

Desembarque

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